Artigo: Black Friday e as propagandas enganosas
21/11/2019 15h53
No Brasil, a Black Friday só chegou, oficialmente, em novembro de 2010 e a data passou a ser incluída no calendário comercial brasileiro visando o potencial de vendas, espelhado no exemplo americano. Confira no artigo escrito pela advogada cível Rosana Platero, os cuidados que devemos tomar nessa data
Rosana Platero, Coordenadora da área Cível
rosana@claudiozalaf.com.br
Embora hoje o termo “Black Friday” esteja associado ao maior dia de compras dos Estados Unidos, esse termo (literalmente “Sexta-Feira Negra” em inglês) surgiu em 24 de setembro de 1869, quando dois influentes especuladores da Bolsa de Valores de Nova York, Jay Gould e James Fisk, tentaram alcançar altos lucros por meios duvidosos, no entanto, fracassaram e acabaram quebrando o mercado de ouro.
Diante disso, o governo americano foi obrigado a intervir para corrigir a distorção, elevando a oferta da matéria-prima no mercado e, consequentemente, os preços caíram, e muitos investidores perderam grandes fortunas, sendo então, a data considerada uma “sexta feira negra”.
Foi quando em meados do século 19, Abraham Lincoln, o então presidente dos EUA, declara o “Dia de Ação de Graças” na última quinta-feira de novembro, antecipando as compras de Natal. Era a chance que os vendedores tanto esperavam para sair “do vermelho” e voltar para o “preto” com campanhas comerciais, fazendo com que a última sexta feira de novembro (dia seguinte ao Dia de Ação de Graças) houvesse uma “corrida” às lojas para que os consumidores aproveitassem as ofertas.
Esta festividade que começou nos Estados Unidos, tem-se estendido pelo resto dos países do mundo com a ajuda das novas tecnologias e promoção por parte de diversas empresas.
O Walmart, maior varejista do mundo, quebrou a tradição do Black Friday em 2011, quando abriu sua loja aos clientes na noite do feriado de Ação de Graças.
No Brasil, onde o feriado de Ação de Graças não existe, a Black Friday só chegou, oficialmente, em 28 de novembro de 2010 e as vendas foram totalmente online, reunindo mais de 50 lojas do varejo nacional.
A data passou, então, a ser incluída no calendário comercial brasileiro visando o potencial de vendas, espelhado no exemplo americano.
Segundo o Procon, em 2013, a Black Friday no Brasil bateu seu recorde, faturando R$770 milhões em comércio online. Em 2014, a data gerou R$1,2 bilhão em vendas somente na internet, que corresponde a 3,5% do faturamento anual, consolidando assim a Black Friday como uma das datas mais importantes para o comércio nacional.
Como nem tudo são “flores”., com o crescimento exponencial do faturamento sobre as vendas, começaram a surgir diversas reclamações dos consumidores referentes às práticas fraudulentas que as empresas estavam cometendo, como, por exemplo, a maquiagem de preços e os falsos descontos.
Em 2017, foram 3,5 mil reclamações, um aumento de 20,6% em relação a 2016, segundo enquete do site “Reclame Aqui”.
No ano passado (2018), a maior queixa registrada pelo Procon sobre a Black Friday foi em relação à propaganda enganosa (14,2%). Outros problemas relacionados foram quanto à divergência de valores (7,6%) e problemas para finalizar a compra (7,6%).
Com esse recorrente problema da “maquiagem de preços”, os consumidores brasileiros apelidarem o evento de “Black Fraude” nas edições anteriores. A prática da maquiagem, também conhecida como “metade do dobro”, consiste em aumentar os preços antes da data do evento para depois baixá-los e nomeá-los como “superdescontos”, assim como a diferença dos preços anunciados no momento da compra e na hora do pagamento do pedido.
Esses são alguns exemplos de “propaganda enganosa”. Legalmente falando, a propaganda enganosa é “toda manifestação de caráter publicitário que induza o consumidor ao erro, sendo propagada de forma passiva ou ativa”. A propaganda enganosa não é necessariamente direta, oferecendo um produto específico, mas também pode ter caráter informativo, que sugira algo ou alguém.
A omissão de informações também pode ser caracterizada como propaganda enganosa e se a omissão for referente a aspectos que envolvam a saúde e a segurança do consumidor, o problema poderá ser elevado a âmbito penal.
Embora nosso ordenamento jurídico, com a edição há quase 20 anos do Código de Defesa do Consumidor (CDC), tenha sido um avanço legislativo para coibir práticas abusivas e proteger o cidadão das diversas condutas ilícitas praticadas pelos vendedores de produtos e serviços, muitas ilegalidades ainda são verificadas.
Dentre uma série de artigos que condenam esse tipo de prática, destacam-se as Sessões II e III, especificamente o artigo 37, §1º do CDC que trata sobre a Oferta e sobre a Publicidade dizendo, dentre outras que:
“É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capazes de induzirem a erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços”.
Veja-se que maquiar o preço, fazendo o consumidor acreditar que está obtendo um grande desconto ou vantagem quando, na realidade, não passa do preço comum de mercado, é passível de multa pelos órgãos fiscalizadores e de devolução do produto com a respectiva restituição do preço pago ou a troca do produto, se assim preferir o consumidor, caracterizando-se, portanto, como propaganda enganosa seja pela ação ou omissão capaz de enganar o consumidor e induzi-lo a erro.
Ao consumidor resta a responsabilidade de fiscalizar os desrespeitos à lei do consumidor, denunciar quando necessário e se precaver das empresas maliciosas que buscam fazer de tudo para vender seu produto.
Diante de uma propaganda enganosa, é prudente o consumidor entrar em contato com o fornecedor e informá-lo sobre o desacordo. Caso ainda se sinta lesado de alguma forma, pode requerer o seu direito nos termos do artigo 35 do CDC:
Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha:
I – exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade;
II – aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente;
III – rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.
Além disso, também é cabível a responsabilidade civil, isto é, o dever de indenizar o consumidor lesado, conforme previsto no artigo 986 do Código Civil que preceitua que:
“Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”
Não sendo o bastante, o consumidor deve recorrer aos órgãos de proteção do consumidor, como o Procon de sua cidade e, se mesmo assim, não houver solução, o ideal é dar início a uma ação judicial, cabendo ao consumidor o direito de ser indenizado por perdas e danos, em razão da publicidade enganosa e abusiva a qual o produto ou serviço estiver relacionado.