PGR questiona no Supremo artigo da CLT que limita alteração de súmulas pelo TST
08/07/2019 12h03
Para a PGR, os dispositivos “atentam contra o núcleo essencial da autonomia dos tribunais” e que “pretendem regular matéria interna” do Poder Judiciário, o que fere ao princípio constitucional da separação dos poderes
A Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou, nesta quinta-feira (4/7), uma ação no Supremo Tribunal Federal questionando a constitucionalidade de artigos da reforma trabalhista que criam critérios para que o Tribunal Superior do Trabalho (TST) altere e edite súmulas e orientações jurisprudenciais.
Para a PGR, os dispositivos “atentam contra o núcleo essencial da autonomia dos tribunais” e que “pretendem regular matéria interna” do Poder Judiciário, o que fere ao princípio constitucional da separação dos poderes.
Os mesmos dispositivos já são alvo de uma ação declaratória de constitucionalidade no Supremo, ajuizada pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif). Em março, o TST decidiu esperar decisão do Supremo sobre o tema e adiou a primeira atualização de jurisprudência que faria após a reforma trabalhista.
Os dispositivos atacados pela PGR na ação direta de inconstitucionalidade 6.188 estabelecem que o TST só pode estabelecer ou alterar súmulas caso a mesma matéria já tenha sido decidida de forma idêntica por unanimidade em, no mínimo, dois terços das turmas em pelo menos dez sessões diferentes em cada uma delas.
O vice-procurador da PGR, Luciano Mariz Maia, pede na petição inicial que sejam declarados inconstitucionais a alínea ‘f’ do inciso I e os parágrafos 3º e 4º, do artigo 702 da CLT, instituídos pela Lei 13.467/2017, a reforma trabalhista.
“Referido princípio centra-se na noção de que as funções (principais ou típicas) do Estado são ‘separadas’, de modo que cada ‘Poder’ exerce, de modo autônomo e responsável, uma dada função típica que lhe fora atribuída pela Constituição, para fins de garantia dos direitos e das liberdades dos cidadãos. Tais disposições normativas afrontam direta e ostensivamente os princípios da
separação dos poderes e da independência orgânica dos tribunais, para além de se apresentarem irrazoáveis e desproporcionais aos fins visados”, diz Mariz Maia na petição inicial.
O vice-PGR diz que os dispositivos “impõem, preordenam, condicionam e balizam o funcionamento dos órgãos internos dos tribunais do trabalho com ordens procedimentais de atuação ou abstenção para os órgãos competentes do TST e dos tribunais regionais do trabalho” de modificarem orientações jurisprudenciais. Por isso, afrontariam os artigos 96-I a e 99 da Constituição, “por legislarem em âmbito normativo exclusivamente restrito aos regimentos internos desses tribunais, como consequência da sua independência orgânica, assegurada ao Poder Judiciário como um todo e a cada um de seus órgãos”.
A PGR pede que seja declarada a inconstitucionalidade dos artigos e que seja concedida medida cautelar para suspender imediatamente os efeitos deles, até que o Supremo aprecie o mérito da ação. Por enquanto, a ADI não foi distribuída a nenhum relator – mas a PGR pede que a ação seja de relatoria de Ricardo Lewandowski, já que ele é o relator da ADC sobre os mesmos dispositivos.
Para o órgão, há necessidade de conceder a liminar justamente pois o TST está aguardando posicionamento do STF sobre o tema e, enquanto isso, há súmulas do tribunal que conflitam diretamente com a reforma trabalhista. Para a PGR, a demora em decidir sobre a matéria aumenta a insegurança jurídica e retarda o julgamento de ações trabalhistas, cujas verbas têm caráter alimentício e, portanto, os processos devem tramitar com celeridade.
A PGR argumenta ainda que há “ineditismo legislativo” na norma, pois as outras áreas do Judiciário não têm de se submeter às exigências previstas no artigo 702 da CLT, inserido pela reforma. “Nos termos do artigo 103-A da Constituição, são apenas exigidas ‘reiteradas decisões sobre a matéria constitucional’ para a edição de enunciado sumular vinculante pela Corte Constitucional. Não se exige o número mínimo de decisões sucessivas, nem requisitos configuradores de ‘reiteração’, tampouco há obrigatoriedade constitucional ou legal de que tais decisões sejam idênticas e unânimes”, diz Mariz Maia.
“Eventual entendimento pela constitucionalidade do procedimento exigido pela Lei 13.467/2017 significaria a autorização pelo Supremo Tribunal Federal para que o legislador, por simples lei ordinária, cuja aprovação independe da exigência de procedimento legislativo mais complexo e de quórum qualificado, pudesse impor os mesmos procedimentos ao próprio STF e a todos os demais tribunais do país, o que, à evidência, é irrazoável e inadmissível”, argumenta o PGR.
Atualização de súmulas travada
No dia 20 de março, o Pleno do TST se reuniu para julgar uma arguição de inconstitucionalidade contra a alínea ‘f’ do artigo 702 da CLT. Entretanto, dois dias antes a Consif ajuizou uma ADC no Supremo pedindo, em caráter liminar, a suspensão do julgamento da revisão de súmulas no TST e a observância do artigo 702 da CLT. A liminar, entretanto, nunca foi concedida.
Ainda assim, por maioria, o TST decidiu aguardar decisão do STF sobre o tema. Em dois memoriais enviados ao Supremo posteriormente, o presidente da Corte trabalhista, ministro Brito Pereira, pede para que o dispositivo seja declarado inconstitucional por interferir na independência do tribunal.
O adiamento do julgamento da ação no TST e consequente alteração de súmulas foi sugerido pelo relator, o ministro Márcio Eurico Vitral Amaro, que justificou “prudência e respeito ao princípio da segurança jurídica”. O TST tinha a intenção de analisar 14 súmulas e cinco orientações jurisprudenciais, mas, como os ministros não chegaram a analisá-las, não se sabe quais eram.
Uma das súmulas que deve ser alterada é a que trata sobre o pagamento das horas in itinere, termo referente ao tempo de deslocamento de um trabalhador entre a sua residência e o trabalho em local de difícil acesso. A súmula contraria diretamente a reforma trabalhista, que dispõe que este período não deve ser considerado na carga de trabalho e não deve ser pago como hora extra.
Fonte: JOTA