Que postura deve adotar o empregador em momentos de greve?
05/06/2018 17h01
No artigo do dr. Ricardo Della Torre, Gestor do setor trabalhista de Limeira, confira o que prevê a legislação sobre faltas e atrasos em decorrência da greve e a recomendação pessoal do nosso escritório
É visível para todos nós que a greve dos caminhoneiros trouxe à tona uma situação inédita e até então não experimentada por milhares de trabalhadores: a dificuldade adicional de deslocamento até os postos de trabalho. Varias localidades foram afetadas, inclusive a nossa região de forma intensa, por falta de combustível nas empresas de ônibus. O deslocamento por meios particulares também foi fortemente afetado, pois não havia postos de gasolina para fornecer combustível e fazer o abastecimento.
Neste contexto, varias empresas optaram por alterar o horário de funcionamento, outras pela elaboração de um banco de horas ou da realização do trabalho em casa em sistema de home office. No entanto, existem empresas que seguiram o expediente normal de trabalho, surgindo várias dúvidas e questionamentos sobre como proceder.
De início, é importante ter em mente que o artigo 473 da CLT não prevê entre as hipóteses de justificativas para faltas ou atrasos as greves gerais no sistema de transporte urbano ou rodoviário. Assim sendo, fazendo uma interpretação literal, inexiste impedimento legal para o desconto pelo dia de falta ou atraso por parte do empregado. Tratando-se de uma situação extraordinária, não temos regras trabalhistas específicas para a situação que o Brasil vivenciou nos últimos dias.
Então, pelo que vimos até aqui as faltas injustificadas são passíveis de descontos. Contudo, fazendo o exercício do uso do bom senso – lembrando que os Juízes do Trabalho farão o mesmo – se pelos meios usuais o empregado não conseguiu chegar ao trabalho, a sua ausência deverá sim entrar para o grupo de faltas justificadas. Daí advém a importância do bom senso e boa-fé entre patrão e empregado.
A situação fica da seguinte forma: se o empregado não teve o seu deslocamento afetado, aos menos nos horários de seu turno, sua falta não poderá ser atribuída a atual crise e, assim, será uma falta passível de advertência e desconto. Se o empregado vai de carro, mas está sem gasolina, existindo ônibus para o deslocamento, não haverá justificativa para a falta. A contrário senso, nos casos em que o empregado tentou ir ao trabalho e não conseguiu, por falta de gasolina e falta de transporte público, estaremos diante de um caso de força maior, sendo que, nesta hipótese, o empregador não poderá descontar o dia não trabalhado, sob pena de, futuramente, ser alvo de uma ação judicial.
Desta forma, fica claro que a situação é subjetiva e irá depender do estudo de caso a caso. O que se sugere nestas situações é que o empregado demonstre como tentou ir trabalhar, com fotos da parada de ônibus onde esperou por transporte, por exemplo. Importante, ainda, que o empregado mantenha contato em tempo real com o seu gestor imediato, relatando a tentativa de chegar ao emprego. Simplesmente não ir ao posto de trabalho, sem sequer avisar que tentou, enfraquece qualquer justificativa, ainda mais atualmente onde os meios de comunicação são amplos e eficazes.
Nesta esteira, importante esclarecer que as empresas podem sugerir o uso de aplicativos para suprir o transporte na falta de ônibus, como Uber por exemplo. Para os empregados que usam carro ou já costumam chamar transporte por aplicativos, se a viagem custar mais caro do que a realizada em condições normais, o empregador deve compartilhar esse gasto com o empregado.
Salienta-se que as empresas não são obrigadas a providenciar transporte se o empregado não puder ir ao posto de trabalho. No entanto, para tentar manter a sua rotina de funcionamento, poderá ser montado um esquema para buscar e levar os colaboradores, do contrário, cairemos nas situações acima apontadas.
Assim sendo, diante desta lacuna legislativa e de uma flagrante situação de fragilidade, a melhor opção é a negociação entre empregador e empregado.
Na negociação, uma opção válida e rápida é a realização de um acordo de compensação de horas, fazendo-se um estudo sobre a forma de equacionar as horas não trabalhadas. Hoje, com a reforma trabalhista, é possível a realização de um banco de horas diretamente com os empregados, contanto que a compensação das horas seja feita dentro de um período de 6 (seis) meses, o que entendemos ser bem razoável.
Prudente acima de tudo, que o empregador faça uso do bom senso para a tomada de decisões sobre o desconto ou não do dia não trabalhado, com uma análise pormenorizada da situação de cada colaborador, para aí sim deliberar como proceder em meio desta grave crise que estamos vivenciando.
Artigo por Ricardo Della Torre, Gestor Trabalhista
ricardo@zalaflimeira.com.br