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Artigo: Publicidade Infantil – Cuidados com o Marketing no Dia das Crianças

05/10/2020 15h42

Apesar de muitas empresas continuarem investindo em publicidade dirigida diretamente ao público infantil, o Código de Defesa do Consumidor definiu que a publicidade dirigida às crianças é abusiva e ilegal, pois se aproveita da deficiência de julgamento e experiência desse público

Juliana Cecconi Pereira, coordenadora da área Cível
juliana.cecconi@claudiozalaf.com.br

Direcionar a publicidade ao público infantil sempre foi uma estratégia de marketing que visava o apelo ao consumismo e falta de discernimento necessário das crianças.

Na década de 90, as propagandas eram diretamente direcionadas às crianças. Quantos pais não cederam ao chamado “fator amolação”, aos insistentes pedidos de seus filhos diante clássicas propagandas de empresas como Garoto, Caloi e Mundial? Quantos pais não compraram um Mc Lanche Feliz por conta de um brinquedo?

Desde então, com a vigência do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a publicidade infantil foi proibida pela legislação brasileira, com regulamentação pelo CONAR (Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária) apenas em 2007.

A Constituição Federal estabelece em seu artigo 227 a obrigação compartilhada entre toda a sociedade de assegurar os direitos das crianças com absoluta prioridade (proteção integral). O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA reconhece a criança como pessoa em especial fase de desenvolvimento físico, social e emocional, destacando-se o artigo 71, segundo o qual a criança e o adolescente têm direito a informação, cultura, lazer, esportes, diversões, espetáculos e produtos e serviços “que respeitem sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento”. O Código de Defesa do Consumidor – CDC define no artigo 37, §2º, que a publicidade dirigida às crianças é abusiva e ilegal, pois se aproveita da deficiência de julgamento e experiência desse público. O Marco Legal da Primeira Infância (Lei nº 13.257/2016) determina a proteção da criança contra toda forma de violência e pressão consumista e a adoção de medidas que evitem a exposição precoce à comunicação mercadológica. A Resolução nº 163 de 2014 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) reforça o CDC ao detalhar o conceito de abusividade de toda e qualquer e qualquer publicidade dirigida ao público infantil, com o intuito de persuadi-lo ao consumo de produtos e serviços.

Ademais, os órgãos públicos como Procons, Defensorias Públicas, Ministério Público e Poder Judiciário enfrentam arduamente a ilegalidade da publicidade infantil e contam com o apoio do Instituto Alana e do Idec – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor.

Ainda assim, as empresas continuam investindo neste público, já que são os responsáveis por grande parte da influência das compras da família. Recentemente, o McDonald’s foi condenado por realizar apresentações em creches e escolas municipais com um notório interesse comercial por trás do suposto conteúdo educativo apresentado. Os desembargadores do TJSP concluíram que a ação promovida pela empresa configurava estratégia de publicidade infantil, e não uma atividade meramente educativa¹.

Houve pressão da indústria voltada ao setor, e a Senacon – Secretaria Nacional do Consumidor, órgão máximo do sistema de defesa do consumidor no Brasil, vinculado ao Ministério da Justiça, apresentou proposta criando uma portaria com um novo texto para regulamentar a publicidade infantil no país. O Instituto Alana, Idec – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumido e a ACT Promoção da Saúde alegam que a proposta flexibiliza a legislação já existente e abre brechas para que as empresas possam dirigir anúncios diretamente ao público infantil, sem a mediação de pais, mães ou responsáveis, se aproveitando da hipervulnerabilidade das crianças, que não conseguem ainda compreender as intenções persuasivas por trás das mensagens publicitárias. Diversas entidades se uniram e apresentaram um manifesto “Publicidade Infantil já é ilegal”². O projeto foi submetido à consulta pública.
Há de se chegar a um meio termo. Com a chegada do dia das crianças, como é possível que as empresas voltadas a este público possam desenvolver campanhas válidas e não apelativas?

Simples, direcione sua publicidade aos pais! Com informações úteis, a marca pode conquistar a confiança do responsável que possui o poder de compra e decisão.

Além disso, o CONAR determinou uma série de proibições e cuidados na publicidade voltada ao público infantil, que devem ser observadas, tais como: nunca se dirija às crianças com uso de imperativos como “compre” ou “peça aos seus pais”; não gere constrangimento por não consumir o produto; não apresente produtos que menosprezem a alimentação saudável, substituam refeições ou que estimulem o consumo exagerado de comidas ou bebidas; cuidado com a utilização de personagens para atrair a atenção do público do universo infantil.

Considere soluções possíveis a fim de propor caminhos alternativos, com o desenho de novos brinquedos sustentáveis, sem o uso de plásticos, o brincar livre na natureza e o incentivo à troca de brinquedos, que contribuam para proteger as crianças e o meio ambiente.

Assim, o abuso é evitado sem extinguir toda publicidade de produtos voltados ao público infantil, cabendo aos pais o poder de escolha.

¹Processo nº 1127739-71.2016.8.26.0100 (Segredo de Justiça) – Fonte: https://www.migalhas.com.br/quentes/332430/tj-sp—show-do-ronald-mcdonald–e-pratica-ilegal-de-publicidade-infantil-nas-escolas

² Fontes: https://alana.org.br/manifesto-publicidade-infantil-ja-e-ilegal/
https://www.migalhas.com.br/quentes/320114/instituto-alana-critica-proposta-da-senacon-sobre-publicidade-infantil
https://www.migalhas.com.br/quentes/321337/entidades-questionam-no-mj-a-flexibilizacao-da-publicidade-infantil

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